segunda-feira, 20 de junho de 2011

Um par de sapatos na revolução

Por Fernanda Freitas e Rachel Ruas estudantes de Moda do 6º e 7º períodos Universidade FUMEC/FEA.

Resumo: Este artigo retrata o processo de desenvolvimento do Design de Calçados através das mudanças de comportamento da década de 20. E também o modo de como o calçado interage com o nosso modo de vestir e de nos expressar a partir do mesmo.
Palavras-chave: sapatos, moda, comportamento, década de 20.
Há muitos séculos, não existiam fôrmas de sapatos, e os calçados não se dividiam entre pé esquerdo e pé direito, era igual para os dois pés e não tinha o conforto das formas atuais. O couro foi um dos primeiros materiais utilizados na confecção de sapatos e até hoje continua como material indispensável. Os calçados nunca mais foram os mesmos depois da utilização do couro e da borracha na fabricação de solados.
Nos anos 20, uma empresa americana, United Shoes Machinery Company, introduziu máquinas que permitiam colar e não mais pregar a sola no corpo do calçado, revolucionando assim o sistema de produção. Essa novidade tornou os sapatos mais leves.
Para quem não conhece o processo de fabricação de um par de sapatos, pode se surpreender. A julgar pela aparência não percebemos o processo de fabricação, que é bastante interessante. Os solados, por exemplo, são furados para o sapato ficar mais leve. Os saltos altos e finos, não podem quebrar de forma alguma. Os primeiros saltos eram de madeira e foram criados por volta de 1600. Na metade do século XX, os calçados começaram a ser fabricados com materiais de cortiça e acrílico, e atualmente os solados são fabricados com poliestireno ou nylon. Com o surgimento de novas tecnologias, como a fibra de carbono, é possível criar novos formatos, redução significativa de peso e alta resistência a impactos.
As fibras de carbono têm a função de reforçar os materiais termoplásticos e resinas, com as quais se fabricam os saltos. Um pino de metal no corpo de plástico foi uma técnica definitiva para o salto agulha, criada pelo francês Roger Vivier, que trocou seu ofício de escultor pela confecção de sapatos.
Outro componente importante para a confecção de um sapato que determina grande parte do conforto é a palmilha, que faz a ligação com a parte de cima, chamada de cabedal e o solado.
Inicialmente o ofício de sapateiro tinha o mesmo status de outros prestadores de serviços como carpinteiros e jardineiros que eram profissões que não recebiam o devido reconhecimento pelo seu trabalho, isto comparado ao valor dado aos costureiros das grandes maisons, que eram valorizados pelos seus trabalhos. A passagem do século XIX para o XX na Europa, com as mudanças no comportamento e nos modos de se vestir, o comprimento dos vestidos subiu de forma que os sapatos ficaram visíveis, sendo assim garantiu que o sapateiro tivesse o direito autoral sobre a sua criação, pois a visibilidade dos calçados trouxe destaque aos seus criadores.
De 1900 a 1914 Paris viveu para a moda. As atrizes da época exerciam uma grande influência, vestindo os modelos de estilistas como Poiret, Worth e Paquin. O primeiro sapateiro do nosso século foi André Perugia. Abriu sua primeira boutique aos 16 anos em Nice, sua cidade natal. Filho de pai sapateiro, Perugia logo entendeu que seu pai viveria e morreria fazendo a mesma coisa.
Nessa época até então só nos palcos de Londres, Paris e New York, é que se viam alguns sapatos criativos. Um fato curioso é que só as atrizes tinham o direito de exibir cores escandalosas, cometer exageros e usar materiais de decorações, considerados vulgares pela alta sociedade. Após o espetáculo, as atrizes usavam sapatos de cetim.
Antes mesmo de André Perugia, a alta sociedade parisiense no início do século só calçava Yanturni. Um sapateiro competente, mas que nunca assumiu de fato esse ofício como profissão. Ele fabricava sapatos por puro prazer e não teve nenhum assistente e nem montou nenhum atelier. Tinha poucos clientes e extremamente pacientes, pois um sapato de Yanturni poderia demorar a ficar pronto. Mas esses clientes adoravam a leveza e delicadeza dos seus sapatos confeccionados com materiais antigos que Yanturni comprava de colecionadores ou pela procura no Mercado das Pulgas. Ele usava pedaços de brocado, veludos medievais, lamés prateados, aplicações de renda como materiais para criar seus sapatos. Por nunca ter assumido a profissão foi que André Perugia, ficou conhecido oficialmente como o primeiro sapateiro do século XX.
Poiret no auge de sua fama, logo percebeu os sapatos extraordinários de uma de suas clientes e foi até Nice para convidar Perugia que os fabricava para expor seus modelos na Maison de Paris. Com a explosão da I Guerra em 1914, Perugia só pode abrir finalmente sua boutique seis anos mais tarde. Foram seus sapatos mais extravagantes e criativos que o tornaram notável.
Em 1920 os sapatos dos Estados Unidos conquistaram o primeiro lugar no mundo, pois contavam com o talento dos imigrantes europeus, principalmente os italianos.  Até então, as mulheres só usavam bottines (se tratava de uma bota de salto encorpado e estilo vitoriano, ideais para a época em que os pés expostos não eram adequados e quanto mais o comprimento dos vestidos subia maiores ficavam o cano das bottines). Um dos primeiros fabricantes americanos foi Israel Miller, fundada em New York desde 1881, sua loja era especializada em sapatos de teatro. Miller dividia com Capezio a glória de calças todos os espetáculos da Broadway e depois de trinta anos o seu nome ficou conhecido internacionalmente.
Adolph Dassler criou o primeiro sapato de corrida do mundo e isso aconteceu exatamente em 1920. Até então, as pessoas praticavam esportes com seus sapatos de todos os dias, sapatos muito pesados e desconfortáveis. Dassler criou os sneakers que eram mais leves. Em todos esses anos, o sneaker sofreu grandes modificações, mas é sem dúvida o sapato mais poderoso do século. A receita permanece invencível até os dias de hoje. Por isso o tênis é considerado o sapato do século.
Após a I Grande Guerra (1914-1918), as mulheres tinham um novo ritmo de vida. Ela se tornou ativa, passou a ocupar o mercado de trabalho, precisando de roupas e sapatos funcionais. Surgia uma nova mulher, nova silhueta, novos costumes e claro novos sapatos.
 “Igualdade entre sexos, amor livre, novo status para casadas e solteiras dentro da sociedade... Todos estes temas centralizavam conversas.” (NAHUM, 2008, p.15)
A moda dos anos 20 não valorizava as curvas da silhueta feminina. O novo ideal de beleza era andrógino. Os vestidos tinham decotes rentes ao pescoço, cintura baixa com caimento sem definição nos quadris e busto. Os cabelos eram curtos e retos batizados de à la garçonne. Outra manifestação de funcionalidade estava no estilo dos sapatos:
“Linhas geométricas, caracterizadas por tiras, que se prendiam no peito do pé, recortes, cortes e aberturas, comungavam com saltos rasos, médios ou altos, mas nunca finos. O pisar com segurança e estabilidade fazia parte das conquistas da mulher após Primeira Guerra.” (NAHUM, 2008, p.15.)
Após a crise de 29 o estilo passa a ser mais sedutor com saltos altos, sandálias de pontas abertas e tiras e volta do tornozelo, colocando assim os anos 20 no passado e trazendo uma concepção de uma nova mulher e uma nova moda.
Para as mulheres dos anos 20 era necessário deixarem os pés a mostra, uma vez que os mesmos junto às pernas simbolizavam sedução. Nas danças estava explícito o ritmo da época, o Jazz, e refletiam os sapatos bicolores, brancos e pretos que os americanos chamavam de spectator-shoes. No cinema as sapatilhas seduziam e ganhavam sua versão esportiva, porém não foram bem aceitas, foi só nos anos 40 que Clair McCardell pediu a Capezio o rei do sapato que confeccionasse uma “ballerines” com sola bem fina, estava então criada à sapatilha usada nos anos 50 e nos dias atuais.
É possível então se concluir a importância do desenvolvimento do calçado nos anos 20 e os seus benefícios que perduram até os dias de hoje. Uma mudança comportamental que estimulou a transformação da mulher catalogando assim as imagens que temos atualmente. 

Bibliografia:
MOTTA, Eduardo. O Calçado e a moda no Brasil: Um olhar histórico. São Paulo: Assintecal, 2004.
O’KEEFFE, Linda. Sapatos: Uma festa de sapatos de salto, sandálias, chinelos. Colónia: Könemann, 1996.
NAHUM, Perla.  Sapatos: crônica de uma sedução 1900-2008. Franca, São Paulo: Francal Feiras, 2008.

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