segunda-feira, 20 de junho de 2011

Desconstrucionismo.

Por Bia Drumond, Bruna Abreu e Taciana Leite, alunas do 7° período de Design de Moda da Universidade FUMEC.

A construção perfeita de roupas, do requinte no acabamento exato e cuidado com modelagem, foi uma tradição européia até a década de 80, principalmente na alta-costura. Os padrões de excelência em moda eram roupas impecáveis, com o corte perfeito, arremates bem feitos e peças forradas. Essa era inclusive uma forma de em relação à moda que se praticava até então.

'No entanto, alguns grupos e estilistas começaram a propor uma desconstrução de roupas, tentando romper com a concepção atrasada do vestuário, deixando alguns acabamentos em aberto propositalmente, abrindo peças de maneiras inusitadas, para que novas formas pudessem surgir, causando modificação na modelagem. Roupas nada convencionais, desestruturadas, amassadas e rasgadas, redefiniram conceitos até então imutáveis. Sem levar em conta as formas do corpo, num corte assexuado, criando imperfeições de maneira proposital e usando cores sombrias.

Os jovens estilistas japoneses: Rei Kawakubo, Yohji Yamamoto e Issey Miyake, revolucionaram códigos de sedução, revendo seus sinais exteriores de riqueza, redefinindo sua relação com o corpo do homem e da mulher. Para modificar radicalmente a forma de incompreensão estabelecida entre o belo e o feio, o antigo e o futuro, a memória e a modernidade.
Se opõem aos altos custos da alta-costura, ao brilhantismo do prêt-à-porter, ao futurismo das vanguardas. Inventam um novo código de vestir, reduz tudo ao essencial, sem jóias, sem ornamentos, sem detalhes. A concepção de um vestido se baseia na idéia abstrata que tem da mulher.

Paris parece-se com o Japão: era a frase inicial dos jornais parisienses na semana de moda outono inverno 1982. Os desfiles de Rei Kawakubo e Yohji Yamamoto causaram um grande impacto na cultura europeia, muitos críticos não intendiam ou não desejavam este estrondoso abalo na forma de se fazer moda.

Vera Gertel, em uma matéria chamada “Revolução na Moda” para a revista Desfile, escreve o seguinte: “E o resultado foi o aparecimento de roupas cujos panos são trabalhados, cortados, recortados, amarrados, originando formas amplas, longas, bizarras, inventaram o look pobre ou rico miserabilíssimo, que entrou em forte contraste com a busca de luxo e requinte dos estilistas ocidentais.”

Rei Kawakubo é descrita como “Arquiteta do vestido, desconstruindo a roupa para reconstruí-la melhor, inovadora em tudo” , por François Baudot, e suas criações definidas como “As roupas estranhas, não convencionais, desestruturadas, amassadas e rasgadas trouxeram um novo conceito, geraram polêmica, influenciando inúmeros outros estilistas e praticamente estabelecendo os rumos da silhueta adotada nos anos 80.” Rei Kawakubo é referência em todos os sentidos: pensamento sobre forma de loja, trilha sonora, desfile, casting, temáticas e principalmente criação e modelagem. Não é à toa que é tida por muitos estilistas como guru máxima e seus desfiles mobilizam e influenciam todos os que pensam e fazem moda no mundo.
“Issey Miyake. (...) Não compactuando com os mesmos princípios de corte das roupas ocidentais, que procuram modelar o corpo tridimensionalmente, preferiu adotar a técnica japonesa da confecção do quimono, que corta o tecido no plano e não elimina as partes excedentes, aproveitando-as como um prolongamento sugestivo de conforto e despojamento. Ficou conhecido por contestar, pesquisar, questionar e estar sempre à procura de novos caminhos para a indumentária.” Definido dessa maneira pelo dicionário da moda, Miyake foi pioneiro em pensar roupas que pudessem se transformar. Criou o tubo sanfonado que podia ser colocado como vestido, gola, casaco, etc. As suas relações entre forma e função sempre estiveram ligadas a conceitos muito fortes que norteiam cada uma das suas coleções.

O modelo parisiense de Yamamoto nos anos 80 é amplo, a roupa geralmente pesada, opaca, obscura, bem longe do corpo, ela parece muitas vezes ficar em pé sozinha. Capas superdimensionadas, casacões desestruturados, casacos assimétricos.
A simetria, símbolo da perfeição, não é muito humana, e é precisamente no humano que Yohji busca suas referências. Yohji o mais filósofo dos criadores de moda declara:
- “Se a moda é a roupa, ela não é indispensável. E se a moda é uma maneira de perceber nosso cotidiano, então ela é muito mais importante. Dentre tudo que se chama arte, pintura, escultura etc. -, poucas podem como a moda ou a música, influenciar tão diretamente as pessoas. A moda é uma comunicação única, essencial, relativa a sensações vividas por uma geração que usa a que quiser.”
- “Se a moda de uma estação é interessante ou não, não é responsabilidade dos criadores, mas antes de tudo daqueles que a olham e compram.”
- “Os que usam minhas roupas querem afirmar um ponto de vista.” A frase que Yohji usa a mais de vinte anos para expressar seu trabalho.

Tanto com o desenvolvimento do trabalho e da linguagem de cada um desses estilistas (que até hoje são revolucionários pela maneira como pensam e propõem o vestir, dando a ele novos significados) como pelo surgimento de novos estilistas que coincidentemente ou não começaram a investigar a desconstrução de roupas.

“A moda francesa tem seus mestres: os japoneses (...) as roupas que eles propõem em 1982 para os próximos vinte anos são de tal forma mais prováveis do que aquelas anunciadas em torno de 1960 e as de Cardin para o ano 2000, que hoje soam tão velhas quanto um filme de ficção científica soviético. Os costureiros franceses acreditaram durante muito tempo que a costura, como a ciência, era a retificação de um logo erro. Os estilistas japoneses, por sua vez, preparam as mulheres da Terra para decidir rapidamente que roupas e acessórios usarão no dia em que não tiverem mias do que uma hora para fugir.”

Um dos nomes ocidentais pioneiros na pesquisa da desconstrução é Martin Margiela, descrito pelo dicionário da moda como: “Um dos representantes do movimento de desconstrução na moda, o seu trabalho é caracterizado por uma apreciação poética da imperfeição, do não conformismo e da excentricidade. Ficou conhecido por seu estilo provocador, fazendo casacos com quatro mangas, cortando bainhas no fio e deixando-as inacabadas, colocando mangas maiores do que as cavas, com conseqüente sobra de tecido, costurando bolsos em lugares inusitados e prendendo sua etiqueta em branco por apenas quatro pontos de linha.” E por François Baudot como “Teórico, homem de laboratório, seu laconismo e sua singularidade incomodam. Costuras aparentes, ourelas com debruns, cores vivas, desconstrução sistemática e reinvenção permanente: suas silhuetas, que parecem predizer um novo futuro para a roupa, revelaram um dos grandes talentos da sua geração”.
Com a revolução gerada por esses estilistas, e por outros que deram continuidade, que seguiram a trilha aberta por eles, a moda nunca mais foi a mesma. Hoje, essa idéia já foi totalmente absorvida pela moda, e faz parte da criação de muitos estilistas pelo mundo.

O ato de desconstruir um peça já pronta, reciclar roupas usadas ou até mesmo compradas em brechós, abrimos espaço também para que o inconsciente nos ajude no processo criativo, com o elemento imprevisto, inesperado. Olhamos as formas de outro jeito em relação ao corpo, ligada a uma postura inovadora, é preciso ousar sem deixar capturar-se pelas formas prontas para vestir, formas dominantes, homogêneas e reprodutíveis.
Assim, a criação que parte da desconstrução torna-se reconstrução, baseada em formas antigas, mas que agora apenas lembram peças que foram, e tornam-se novas, reiventando-as. Carregadas de sentido criativo e ré-significadas por um novo olhar.

Referências:

BAUDOT, François. Universo da Moda: Yohji Yamamoto. São Paulo. Cosac & Naify, 2000. 80p.
MITCHELL, Louise. The cutting edge: fashion from japan. kyoto Japan. ph publishing, 1997.
 

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