domingo, 24 de junho de 2012

Diálogo entre identidade e técnica.

Por: Camila Sudano e Isabela Bernardes



O artigo em questão propõe investigar o processo de construção da identidade de um grupo comunitário, a partir dos fragmentos e elementos culturais encontrados na favela, tendo o seu ponto de partida e referência na técnica do patchwork.  A estruturação do patch e os conceitos de construção deste painel são somados à metodologia do design, o que auxilia uma agregação de valores para os objetos produzidos por beneficiárias do projeto de extensão ASAS-Artesanato Solidário no Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte.
Palavras-chave:
Identidade, favela, construção, cores e texturas, moda, elementos, fragmentos, artesanato, design, desenvolvimento e vivência.

Para muitos, viver de certa forma, se vestir e comportar perante a sociedade representa o que de fato esse sujeito é. Como em Luxo Aglomerado de Silvia Pio.

“As roupas e toda a composição da moda, em qualquer indivíduo têm função de gerar identidade, e identificar não só perante os outros, mas também a si mesmo. Determinados grupos são identificados a partir da cor e estilo que se vestem, outros apenas por acessórios, isso ocorre em qualquer parte da cidade, na cidade formal e nos aglomerados” PIO, Silvia. Luxo Aglomerado, 2010.

O sujeito pós- moderno, como é chamado hoje, passou por vários conceitos e situações que exemplificam as mudanças nas características pessoais e sociais do sujeito.  A concepção mais interativa da identidade e do eu que ocorre na pós- modernidade foi modificada e formada na sociedade, enquanto essência interior. Como na citação de Stuart Hall (em A identidade cultural na pós- modernidade): “ a pós- modernidade traz com os veículos de informação mais imagens e conceitos que influenciam o indivíduo com sua própria identidade cultural, tornando-o mais provisório, variável e problemático.” (HALL, pág 14, 2007)
Como, então, encontrar e valorizar uma identidade tão vulnerável a seus estímulos, e, com isso, apresentá-la de forma singular vindo esta de uma comunidade carente.
A técnica artesanal do Patchwork, que remonta ao tempo dos faraós ainda no século IX a. C., é bastante utilizada pelo seu caráter de trabalhar com tecidos, de diferentes tamanhos e formas, o que se pode fazer como reaproveitamento dos mesmos. É uma arte que consiste na união de vários retalhos em formas geométricas que formam um mosaico, e podem ser utilizados em roupas, colchas, almofadas, objetos artesanais, etc.
Podemos considerar uma arte totalmente sustentável, pois ela é feita com restos de tecidos, sendo assim um reaproveitamento, que possibilita um trabalho diferenciado, peças criativas e exclusivas. Atualmente grandes indústrias têxteis desenvolvem tecidos especiais para o patchwork, assim como existem revistas, materiais e ferramentas que visam facilitar o trabalho.
Observa-se uma forte identidade no patchwork, cada cultura, cada tribo consegue fazê-lo de diferentes maneiras e formas, atribuindo assim características fortes e dando-lhe identidades. Sua construção a partir dos fragmentos encontrados na favela traz signos e símbolos próprios, podendo, assim, apresentar uma identidade.
A moda e seus artifícios na construção e percepção trazem inúmeras formas, cores e texturas que conceitualizadas dentro da favela, podem apresentar o que é mais simples e forte de uma comunidade, e, consequentemente, do que se encontra no piso de uma sociedade.
O projeto de extensão ASAS- Artesanato Solidário no Aglomerado da Serra, da Universidade Fumec, é caracterizado pela capacitação de beneficiários da comunidade da Serra, na qual são feitas oficinas pelos próprios alunos da universidade. O projeto conta com processos produtivos complementares com intuito de gerar renda aos beneficiários da comunidade. O design contemporâneo aliado ao artesanato urbano são os conceitos trabalhados nas oficinas de capacitação para o desenvolvimento e confecção de produtos com alto valor agregado, que são vendidos em lojas parceiras ao projeto. E todo dinheiro da venda dos produtos são destinados às artesãs do projeto.
Com isso, os alunos bolsistas e voluntários participam de todo o processo desde a sua concepção, passando pelo desenvolvimento e planejamento das atividades, até a realização das oficinas. O projeto é um grupo, onde todos exercitam suas funções em seu núcleo produtivo.
O trabalho com a técnica do patch agregado aos conceitos do design e do artesanato foi feito com o intuito de desenvolver produtos com características da própria comunidade. Parte do princípio da geração de renda, mas com o empoderamento dos elementos em seus produtos que pertencem à realidade vivida na favela. Dá-se aí o trabalho de expressar a identidade cultural e estética.
Ruas desniveladas, casas com tamanhos variados, frutas, verduras, coletivos, pichações, cães, gatos, periquitos e tudo que se vê na favela serviram como base ao trabalhar com a técnica do patch e sua estruturação. Tudo é observado e dialogado na escolha dos tecidos ou de outras fontes para a criação de um painel, por exemplo. Tecidos pardos, estampados de frutas, listrados, retalhos pequenos, grandes, retângulos e quadrados. Assim, deu-se o início para o processo da construção de identidade na comunidade. 
Neste projeto realizado percebe-se que cada um se expressa de um jeito, o que nos apresenta essa diferenciação. Essa mistura entre o design e o artesanato possibilita um trabalho moderno e atemporal. Este projeto proporciona à comunidade uma renda extra, estimula a criatividade e autoestima e traz novas possibilidades de crescimento e trabalho, valorizando cada criador por sua autenticidade.
Esse diálogo entre os conceitos de identidade e a técnica torna-se necessário para a efetivação, estética ou não, de quem é esse sujeito nacional.


Bibliografia
CASTIL, William “ Dinâmica de Grupos Populares”, 1997.
CRANE, Diana “ A moda e seu papel social: classe, gênero e a identidade das roupas.”
JACQUES, Paola “ Estética da Ginga- Arquitetura das Favelas através da obra de Helio Oticia”, 2001.
GARCIA, Nestor “ Culturas Híbridas”, 2001.
HALL, Stuarte “ A identidade cultural na pós- modernidade”, 2007.
PIO, Silvia. Luxo Aglomerado. Belo Horizonte: Fumec/ Fea, 2010.

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